Os gêneros breves

"Os gêneros breves, quando bem praticados, exigem mais que os exaustivos, tanto de quem os comete como de quem os lê. Um aforismo, isto é, duas ou três linhas de pensamento concentrado, dá ao bom leitor mais trabalho que muitas e muitas páginas de prosa corrida. Justamente porque o interesse de quem o escreve é de que o leitor faça por si todo o caminho feito por ele até a fórmula. Um aforismo começa a ser lido depois que se o lê. Já na prosa mais pormenorizada, ao contrário, tudo está lá. Acabada a leitura, resta a impressão. Engana-se por isso quem a julga mais pesada. Ao fim de um dia, alguém cansado não há de se aproximar, prioritariamente, de um Lichtenberg, mas de um romancista ou um ensaísta qualquer, sob pena de não tirar proveito algum do que vai lendo. Outro engano: o de imaginá-la mais demorada. Inversamente, cem páginas de bons fragmentos demandam, além de mais empenho, muito mais tempo do que, digamos, cem páginas de um contorcido Proust. Porque cada frase de um aforista genuíno, sendo independente das demais, exige para si atenção exclusiva, enquanto, em outros escritores, algumas dezenas de páginas servem, por acúmulo, à construção de uma única idéia (um único painel) a ser considerado — páginas e mais páginas e mais páginas para que afinal se saiba que a coisa é realmente conforme já se havia dito na primeira."

NAGEL, G. "Os gêneros breves". In: Lado "b" da minha mente.

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