Depois do crime, a fuga A triste história tinha acabado de se revelar completamente quando saiu correndo e correndo e correndo, correndo às cegas, correndo em fuga. Era como se não pudesse enxergar. Não por cegueira, mas por raiva de olhar pra trás, medo de olhar pra frente e vergonha de olhar pra dentro de si-mesmo. Logo ele, que sempre se orgulhou de sua forma de ver os fatos. Logo ele, tão improvável. Maldita alucinação! Correndo, correndo desesperadamente! Tinha acabado de matar a mulher que amava, que tanto amava! Logo ele? Ele! Correndo, confuso, correndo e correndo e correndo, logo ele! Loucura. Ninguém imaginaria que seria capaz de tal crime condenável. Nem ele mesmo. Tudo confuso. Infelizmente, porém, o fato é que estava consumado: ela morta, quem diria, e ele logo interceptado pelo grupo de policiais que o seguiam. Foi o fim? Depois da fuga, o amor - Alô? Amor? Oi! Tudo bem, e com você? Que bom! Pois é, parece que hoje vai ser um dia bem difícil. É, julgame...
De Julio Cortázar:
ResponderExcluirInstruções para chorar
Deixando de lado os motivos, atenhamo-nos à maneira correta de chorar, entendendo por isto um choro que não penetre no escândalo, que não insulte o sorriso com sua semelhança desajeitada e paralela. O choro médio ou comum consiste numa contração geral do rosto e um som espasmódico acompanhado de lágrimas e muco, este no fim, pois o choro acaba no momento em que a gente se assoa energicamente.
Para chorar, dirija a imaginação a você mesmo, e se isto lhe for impossível por ter adquirido o hábito de acreditar no mundo exterior, pense num pato coberto de formigas e nesses golfos do estreito de Magalhães nos quais não entra ninguém, nunca.
Quando o choro chegar, você cobrirá o rosto com delicadeza, usando ambas as mãos com a palma para dentro. As crianças chorarão esfregando a manga do casaco na cara, e de preferência num canto do quarto. Duração média do choro, três minutos.
pretty nice blog, following :)
ResponderExcluir